terça-feira, 19 de outubro de 2010

O batismo de Ana doida.

Ana é doida. Não sei ao certo quando ela chegou, mas parece que sempre esteve aqui. Ontem eu estava olhando pela janela e a vi parada, como sempre. Olhando pra um nada que aparenta ser mais sólido que meu tudo. Levantou-se e foi até a fonte, carregando sua bolsa. Engraçado como, por inúmeras vezes, eu achei meu apê pequeno e vazio... Mas para Ana, só uma bolsa é suficiente. Seus pertences podem se pegos em qualquer lugar. E seu lugar é o mundo. Ana é livre. Ela sentou na beira da fonte e abriu, cuidadosamente, a bolsa, tirou um tecido, não muito branco, mas não completamente sujo. Colocou-o sobre suas pernas, tirou o que parecia um copo. Se bem que não importa tanto. Para Ana, uma coisa pode se transformar em qualquer outra. Ana é plástica. Mas veja bem, não deixe que meus olhos sejam os seus. Ela não muda facilmente. A questão é que Ana é assim. Se de outra forma fosse, não seria ela. Fechou a bolsa, delicadamente, pegou água da fonte, jogou sobre a cabeça, mas com todo cuidado, para não molhar seu pano. Ana também tem uma lógica. Só não é como a minha ou a sua. Depois de jogar água na cabeça pela terceira vez, o pano foi posto de lado e o corpo entrou por completo na fonte. Antes apenas os pés molhados, agora todo o corpo estava imerso naquela água suja. E pensei, por um minuto, que não era sujeira, mas os pecados que Ana estava deixando na água. Ela ergueu o corpo, pegou o pano, enxugou apenas o rosto, para acabar seu ritual. Talvez ela estivesse apenas tomando um banho, mas, para mim, Ana sabe das coisas. Ana sabe esquecer. Ana é a-temporal. Pegou sua bolsa e foi para seu lugar. Neste momento, que só sobrou eu e minhas coisas inúteis, eu quis ser Ana. As três Anas que eu vi. Eu quis ser três vezes doida. Hoje eu sei que foi a melhor coisa que quis. Mas tenho contas a pagar.

Um comentário:

Quem sou eu

Minha foto
PE, Brazil
Um constante vir a ser. Seguindo a sombra dos moinhos de vento...