terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

"O lago em que habita foi formado pelas lágrimas de sua mãe" ( O lago dos cisnes - Ato II )

      Barulho da água. Foi a pedra que tocou a superfície do lago. Tão rápida e viva! Tocou lhe com velocidade, o furou, o rompeu com precisão. Toda a água estremece perante sua força, mas sua reação não dura muito. A pedra, antes tão rápida e imponente, não demorou a ser consumida por ele. O lago, que não mostrou nem uma resistência ao ser violado, volta a seu estado. Silêncio. Ela observa tudo que acontece em silêncio. Num instante não há mais o barulho da água. Olha. E aperta os olhos, desejando que sejam melhores do que são. Nada muda, ela ainda não pode ver o outro lado. Mas eu posso. Estou sobre os ombros dela, posso ver muito além do que ela pode sentir. Muito embora, gostaria que ela visse. Depara-se com seu reflexo e a extensão se prolonga... Não falta muito para anoitecer e não poderá ver mais nada. Ah! Como pude esquecer?! Ela já não vê. Há muito tempo que anoiteceu. Deixa-se cair sobre si mesma. Pela primeira vez ela soube que eu estava ali. Sentiu meu peso sobre si. E afundou, afundou, afundou... Deitou-se. Seus olhos já não eram mais como o lago. Eram opacos e frios. Anoiteceu. Coloquei meus braços ao seu redor. Puxei para perto de mim. Apertei. Uni ao meu corpo. Não demorou muito. Sem luta e sem dor. O silencio foi quebrado por um sussurro. Avancei e colei meu rosto ao seu; meu ouvido a seus lábios. Desta vez, todo o lago pôde ouvir: “Qual o seu nome?”. Com os olhos fixos, procurando o que jamais poderia ter. Como responder esta pergunta? Sou tantas coisas... Sou o que ele sempre irá procurar... Sou a única coisa que ela tinha e perdeu... Mas não é isto que ela perguntou. Ela quer saber meu nome; então: “Meu nome é Desespero, o prazer é todo meu”.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Conversa de doido


         O telefone tocou, cortando o silêncio, que só existia fora dele.
_ Alô, boa tarde!
_ Boa tarde. Quem é¿
_ Aqui é da empresa de cartões X e gostaria de saber se posso lhe fazer umas perguntas. É possível?
_ O que é possível¿
_ Que eu lhe faça algumas perguntas, senhor.
_ Não sei.
_ Como não sabe?
_ Não sei meu rapaz. Eu nem lhe conheço e você liga para me perguntar o que você pode fazer¿
_ Não era bem isto que eu queria dizer...
_ Então diga o que queria!
_ Quero saber se o senhor vai responder minhas perguntas.
_ Ainda não sei.
_ Não entendo! Como não pode saber?
_ Você ainda não fez as perguntas, como vou saber se posso responder ou não¿
_ Veja bem, meu senhor, eu só estou tentando fazer meu trabalho...
_ Deveria considerar mudar de emprego.
_ Por que acha isto?
_ Você me parece muito inseguro.
_ Eu não estou inseguro! Eu sei muito bem qual é meu trabalho! O senhor que está dificultando.
_ Tem certeza¿
_ Claro! Você não me deixa fazer as perguntas! Vai me deixar fazer as perguntas¿
_ Mas é só o que você tem feito desde que atendi!
_ Não era pra serem estas perguntas.
_ E você diz que sabe fazer seu trabalho...
_ O que o senhor falou¿!
_ Filho, até entendo que você não saiba fazer muito bem seu trabalho... Mas também não entende o que dizem¿! Aí já é demais!
_ Esta foi a gota d’agua! Eu não entrei aqui para isto! Eu sou formado, sabia¿
_ Não... Mas acho bom que estejamos nos conhecendo melhor.
_ Chega!
         Depois do “clic” ele percebeu que o fone do telefone havia sido largado. Logo ele fez o mesmo e voltou para seu quarto. A enfermeira se aproximou, colocou o fone no ouvido e pode escutar baixinho, baixinho... “É isto mesmo! O que estou fazendo aqui¿ Eu sou formado... Não sou¿ O que são estas perguntas¿ Eu não posso passar a vida fazendo isto...”. Ela colocou o fone de volta ao telefone e teve certeza. Mesmo o hospital psiquiátrico que trabalha estando lotado, ainda tem muita gente doida neste mundo.

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Um constante vir a ser. Seguindo a sombra dos moinhos de vento...