domingo, 12 de junho de 2011

Fugindo da chuva


                                          "O que virá depois? - pergunto então para a tarde suja atrás dos  vidros, e me sinto reconfortado como se houvesse qualquer coisa feito um futuro à minha espera" (Caio Fernando Abreu)


As pessoas andam tão apressadas. Parecem incomodadas. Esqueceram que a chuva é natural, inevitável e, apesar de todo estrago que pode causar, tem certa beleza. Esta era sua única preocupação, na cadeira gelada daquele boteco, olhando pela janela.
Já havia passado boa parte da manha, quando foi tomar um café. Queria algo quente e que não lhe custasse muito. Parava naquele boteco às vezes. Por fora parece pequeno, sufocante e sujo. A pintura gasta expõe as antigas camadas de tinta.  A sujeira toma toda a fachada. Por dentro é o que se imaginava por fora. O cheiro é um misto de charuto barato com vinho vagabundo. A iluminação é péssima... A janela fica virada para a rua, mas, de alguma forma, não serve para iluminar o ambiente. Não gosta de estar ali, mas não lhe restam muitas opções. Sempre que entra é como se fosse a primeira vez. O mesmo garçom, nem uma simpatia. Os poucos que estão nas mesas, descuidam de suas vidas, sem reparar em quem entra. Junto ao café pediu uma fatia de bolo. Simplesmente bolo. Não há “sabores”. Não há simpatia, iluminação, música... O único som é dos passos arrastados do garçom e o barulho da chuva na janela. O café é fraco, o bolo é seco e quase sem gosto. Em dias assim, sinto certo conforto neste lugar. Dele posso olhar pela janela e me sentir longe de tudo aquilo. E não tinha percebido antes, mas é possível ver um sutil reflexo de seu rosto, no vidro da janela. Foi quando se lembrou de si. Em algum momento se perdeu entre a manha e a tarde.
Moedas na mesa e mãos no bolso, para enfrentar o frio que fazia lá fora. Na bolsa coisas leve; o peso maior carregava no peito.

Um comentário:

  1. Cada vez que leio o que você escreve, tenho vontade de virar a página, folhear o livro, degustar devagar cada palavra... Tem gosto de sinestesia. Vejo, ouço, sinto...

    ResponderExcluir

Quem sou eu

Minha foto
PE, Brazil
Um constante vir a ser. Seguindo a sombra dos moinhos de vento...